Léo Áquilla não é uma pessoa, Léo Áquilla é um movimento
JCD: Quem é Leonora Mendes de Lima ou simplesmente Léo Áquilla?
Léo Áquilla: Léo Áquilla não é uma pessoa, Léo áquilla é um movimento, inclusive quando me perguntam se eu não tenho medo de morrer, eu sempre digo que não, porque sendo um movimento eu jamais vou morrer, eu vou continuar viva em outros corpos, é uma luta, e essa luta vai continuar, então Léo Áquilla é uma força.
JCD: Como foi o início de sua carreira na tv?
Léo Áquilla: Eu comecei na televisão na década de 90, no show de calouros do Silvio Santos, ganhei um concurso que era na época muito almejado por todos os transformistas e de lá pra cá eu nunca mais parei, fiz várias participações em vários programas até ser contratada depois pela Redetv, quando a Rede TV nasceu. Fiquei 15 anos trabalhando na Redetv. Fui pra Record, fiquei 5 anos, fiz a Fazenda e depois da Fazenda eu fiquei mais 5 anos lá, voltei pra Rede TV e desisti da televisão pra tocar minha vida política, que enquanto eu estava na TV eu estava estudando e me preparando pra ser essa política.
JCD: Com que idade você começou sua transição?
Léo Áquilla: Minha transição se deu início aos 38 anos e com 40 eu transicionei. Comecei tardiamente porque aos 25 descobri que ia ser pai e prorroguei para esperar meu filho crescer. Mas eu sempre soube desde criança o que eu era. Eu apenas precisava desse tempo para amadurecer e depois esperar meu filho crescer.
JCD: Você se graduou em Jornalismo, o interesse na formação era para ser repórter ou apresentadora de tv? Gostaria de ter tido um programa somente seu?
Léo Áquilla: Antigamente, o meu maior sonho era ter o meu próprio programa, lutei muito por isso. Quando eu percebi o tamanho do preconceito que eu ia ter que enfrentar, cheguei a gravar pilotos inclusive na Rede TV para ter o meu programa que se chamaria Unisex, que jamais saiu do papel, jamais saiu do piloto, fizemos piloto, mas os anunciantes não aceitavam que eu fosse a apresentadora, eles tiravam a cota de patrocínio. Então eu acabei desistindo desse sonho, engavetei, vou deixar para uma próxima encarnação, mas eu estudei jornalismo para virar uma comunicadora melhor, mais curta, mais inteligente. Então foi sim por causa da profissão de repórter/apresentadora.
JCD: Como foi sua infância?
Léo Áquilla: Minha infância foi uma b... , mas não vamos usar essa palavra, claro, foi péssima, porque eu sofri muito bullying sendo uma criança trans, sem acolhimento, sem amor, sem cuidado de ninguém, nem da família, nem da escola, nem do bairro, nem da religião, nem do Estado. É uma criança completamente invalidada desde a infância, então eu acho que foi uma infância muito triste, muito ruim, e hoje eu luto para que outras crianças não precisem passar pelo que eu passei, e tantos da minha geração.
JCD: Em 2012 você entrou para a fazenda . Gostou ? Voltaria novamente?
Léo Áquilla: Eu digo que a fazenda foi o melhor e o pior momento da minha vida. Foi bom financeiramente, me deu uma bela exposição, mas me deixou muito deprimida de ficar 94 dias presa sem minha cachorrinha, sem marido, sem mãe, sem pai, sem irmão, sem ninguém. E é por isso que eu digo que foi o melhor e o pior momento da minha vida. Mas eu não faria de novo por nenhum dinheiro desse mundo.
JCD: Como a política entrou na sua vida?
Léo Áquilla: Eu sempre fui política, porque não dá para separar as coisas. O meu corpo é um corpo político, a minha arte era política, sempre fui de conscientização. Eu só mudei de carreira, que eu nem chamo de carreira ser política, eu chamo de missão, quando eu percebi que só como formadora de opinião eu ia conseguir mudar o mundo. Se eu quiser mudar alguma coisa, tem que ser através das leis. Então, no momento em que eu entendo isso, eu vou para a faculdade, faço uma pós-graduação em política e planejo parar de fazer show, de deixar a carreira artística, para tocar a minha vida política, para melhorar a qualidade das leis que combatem a homofobia.
JCD: Em 2016 você se casou e em 2022 se separou ,você é muito reservada quando o assunto é sua vida pessoal, isso seria uma forma de se proteger de notícias como a fake news?
Léo Áquilla: Eu tento manter a minha vida pessoal agora o mais discreta possível porque num caso de separação, por exemplo, acaba envolvendo o Brasil inteiro como envolveu no casamento e as pessoas, o que era o sofrimento que eu tive, que poderia durar seis meses, durou um ano e meio porque as pessoas se envolviam muito e toda vez que eu tentava esquecer as pessoas sempre voltava para assunto e até hoje ainda voltam e acaba me machucando. Então eu decidi que a minha vida pessoal eu não vou mais expor.
JCD: Você é muito querida pelo público, já teve algum stalker?
Léo Áquilla: Sim, sempre tive stalkers de me dar sérios problemas, inclusive pessoas que tatuaram meu nome e depois queriam me matar porque tatuaram meu nome, gente que ficou com ciúme porque outra pessoa também tatuou, gente que quando viu que eu não dava mais atenção, virou inimigo mortal de me perseguir, de me ameaçar, de me processar, porque arrumando problemas, né? Processar por nada. Então eu já tive muitos stalkers e hoje eu me mantenho bem reservado e não me aproximo de fãs, a ponto de ter intimidade.
JCD: Como você vê a política atual?
Léo Áquilla: A política atual, e aqui eu vou fazer um recorte para os LGBTs, que é a minha bandeira, é o momento mais perigoso da história, com uma direita muito conservadora crescendo, conservadora no pior sentido da palavra, porque tem os conservadores que não são radicais, mas esses mais radicais, eles têm uma política de anulação, eles querem aniquilar com a comunidade LGBT, especialmente quem é trans, então é um momento muito perigoso e eu digo que quem não se representa é representado, ou a gente vai lá e faz, ou nós seremos reduzidos a pó, a nada. Digo que o Brasil é uma grande chocadeira, onde um ovo que está sendo chocado e que quando eclodir, será um monstro que está dentro, um monstro conservador, cristão, macho, branco, contra todas as minorias, contra mulheres, contra pretos, então a gente tem que tomar muito cuidado, esse é o momento de realmente se articular.
JCD: Você está muito presente nas questões LGBTQIA+ ,em algum momento você sofreu ameaças?
Léo Áquilla: Eu sofro ameaças no meu cotidiano, já nem me abala mais, já faz parte. É ameaça de todos os lados, principalmente quando eu bato na tecla de que criança trans existe, aí as pessoas que têm mais ódio contra a comunidade LGBTI não entende isso, acabam dizendo que o que nós queremos é desvirtuar as crianças, é fazer uma lavagem cerebral nas crianças e começam a propagar fake news. Essas fake news vão colocando mais pessoas contra a gente, então as ameaças são diárias.
Esse ano, venho como candidata a vereadora de SP, o foco é ganhar
JCD: Você se candidatou 5 vezes , pretende esse ano vir como vereadora?
Léo Áquilla: Das outras vezes que eu me candidatei, não foi na intenção de ganhar, foi na intenção de despertar a comunidade LGBT para se envolver com política, porque eu estava na TV e a minha intenção era só acordar a comunidade. Essa é a primeira vez que venho com disposição para ganhar. Vou jogar para ganhar.
JCD: Qual a primeira coisa que você faria como vereadora eleita?
Léo Áquilla: A primeira coisa que eu vou fazer se eleita é colocar de pé o meu principal projeto que é a Casa Arco-íris, um prédio de 24 andares totalmente LGBT com tudo. Eu disse tudo, coloca tudo em caixa alta que a comunidade LGBT precisa para protagonizar o topo do mundo. A gente vai com isso fomentar turismo, economia, cultura fixa LGBT, empregabilidade, porque são 24 andares, e com o objetivo de transformar o que é uma coordenação LGBT numa secretaria LGBT, porque São Paulo, uma coordenação não comporta, nós precisamos ser uma secretaria.
JCD: Como é a Leonora Vovó?
Léo Áquilla: A Leonora vovó é ausente, é a vó que trabalha muito, que não tem tempo pro neto, infelizmente. Apesar do muito amor que tenho, a carga horária puxada e essa agenda insana que eu tenho não me permite muita proximidade, principalmente porque eles moram longe de mim.
O sistema não me deixou ter uma programa na TV
JCD: Você se sente realizada profissionalmente?
Léo Áquilla: Apesar de ter sufocado e enterrado alguns sonhos, eu sou realizada profissionalmente, trabalho com o que eu gosto, adoro política, adoro combater injustiças, lutar contra o sistema opressor, eu acho que essa é minha missão, é minha vibe mesmo, então eu adoro e me sinto muito realizada.
JCD: Você sempre fala do seu passado e que sofreu muito. Hoje você é feliz?
Léo Áquilla: Eu sofri muito no meu passado, isso é verdade, mas dizer que eu sou feliz atualmente é uma palavra forte demais. Eu sou bem, eu sou bem resolvida, eu estou bem financeiramente, eu estou bem comigo mesma, eu estou tranquila. Talvez isso seja felicidade, eu não sei o que é felicidade.
JCD: Tem algo que gostaria de ter feito e não fez?
Léo Áquilla: A única frustração que eu tenho mesmo, que eu poderia ter feito e não fiz e não foi por falta de vontade e competência, foi não ter tido o meu próprio programa na televisão. O sistema não permitiu.
JCD: Se arrepende de alguma situação?
Léo Áquilla: A única coisa que eu me arrependo foi de ter deixado o sistema opressor me atingir numa idade onde eu estava amadurecendo a ideia de quem eu era, do que era ser uma pessoa trans. E eu fiquei muito raivosa, então nesse período acabei maltratando algumas pessoas porque eu queria descontar na sociedade todas as minhas frustrações. Mas aí eu percebi que hoje era exatamente falta de maturidade. Hoje mais madura, eu me arrependo de infelizmente ter sido contaminada por esse sistema opressor.
JCD: Quem é seu ídolo?
Léo Áquilla: Meus ídolos são as pessoas que passaram por aqui e que deixaram lições de amor. Eu tenho tatuado no meu braço a frase Decidi amar você". Inspirada em Jesus, em Madre Teresa de Calcutá, Dalai Lama, Buda, todas essas pessoas que pregam o amor.
JCD: Como está o seu trabalho na coordenação municipal da diversidade?
Léo Áquilla: A coordenação é um trabalho gigante e a gente faz milagre com uma equipe muito pequena. Quando eu assumi tinha três ou quatro projetos, agora tem 22 e a equipe continua do mesmo tamanho. Então o trabalho quadruplicou e a gente tem que trabalhar de domingo a domingo de maneira insana para dar conta, mas é muito satisfatório quando a gente começa a ver resultado, principalmente o programa de empregabilidade que só esse ano já disponibilizou 3.100 vagas.
JCD: O que te faz descer do salto?
Léo Áquilla: O que me faz descer do salto é injustiça, e eu não aceito não como resposta, e aí é um problema, porque comigo é sim ou sim, e vão ter que dar um jeito, e aí é que começam as confusões, porque como eu não aceito não, eu acabo brigando com quem tiver que brigar para conseguir o que eu quero.
JCD: Quais planos para esses 6 meses restantes de 2024?
Léo Áquilla: Nos próximos seis meses vou focar na minha campanha para ganhar a eleição e depois tirar umas férias e compor meu gabinete sendo eleita.
JCD: Gostaria de uma mensagem.
Léo Áquilla: A mensagem final é para que as pessoas se unam de verdade, principalmente os grupos, como a LGBT, as mulheres, os pretos, esses movimentos, porque esse é o momento de ou a gente se une ou seremos dizimado.
Entrevista - Luciana Perez
Léo Áquilla
Léo Áquilla não é uma pessoa, Léo Áquilla é um movimento
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